10 abril 2015

KANT - Agir por dever

O que é, pois, agir por dever? Agir por dever é agir em função da reverência pela lei moral; e a maneira de testar se estamos a agir assim é procurar a máxima, ou princípio, com base na qual agimos, isto é, o imperativo ao qual as nossas acções se conformam. Há dois tipos de imperativos: os hipotéticos e os categóricos. O imperativo hipotético afirma o seguinte: se quisermos atingir determinado fim, age desta ou daquela maneira. O imperativo categórico diz o seguinte: independentemente do fim que desejamos atingir, age desta ou daquela maneira. Há muitos imperativos hipotéticos porque há muitos fins diferentes que os seres humanos podem propor-se alcançar. Há um só imperativo categórico, que é o seguinte: "Age apenas de acordo com uma máxima que possas, ao mesmo tempo, querer que se torne uma lei universal".
Retirado de História Concisa da Filosofia Ocidental, de Anthony Kenny. Trad. Desidério Murcho, Fernando Martinho, Maria José Figueiredo, Pedro Santos e Rui Cabral (Temas e Debates, 1999).

24 fevereiro 2013

Descartes - Génio maligno

Está gravada no meu espírito uma velha crença, segundo a qual existe um Deus que pode tudo e pelo qual fui criado tal como existo. Mas quem me garante que ele não procedeu de modo que não houvesse nem terra, nem céu, nem corpos extensos, nem figura, nem grandeza, nem lugar, e que, no entanto, tudo isto me parecesse existir tal como agora? (…) Porventura Deus não quis que eu me enganasse deste modo, ele que dizem que é sumamente bom (…).
Vou supor por consequência, não o Deus sumamente bom, fonte da verdade, mas um certo génio maligno, ao mesmo tempo extremamente poderoso e astuto que pusesse toda a sua indústria em me enganar. Vou acreditar que o céu, o ar, a terra, as cores, as figuras, os sons e todas as coisas exteriores não são mais do que ilusões de sonhos com que ele arma ciladas à minha credulidade.
Descartes, Meditações metafísicas, tr. Gustava de Fraga, Almedina, p.110-114.

12 janeiro 2013

Nunca comprometer a verdade.


[Qualquer pessoa pode] perguntar-se se todas as análises económicas existentes a nível mundial servem realmente para alguma coisa. Então não está completamente fora de questão, como matéria política, um programa de recuperação como aquele que acabei de descrever mais atrás? E defender um tal programa não será um desperdício de tempo?
A minha resposta  a estas duas perguntas é: não necessariamente e decididamente que não. As hipóteses de uma verdadeira viragem nas medidas económicas adotadas, virando costas à mania da austeridade dos últimos anos e rumando em direção a uma renovada atenção quanto à criação de emprego, são muito mais válidas do que a sabedoria convencional nos quer fazer acreditar. E a recente experiência também nos ensina uma lição política crucial: é muito melhor defendermos aquilo em que acreditamos, e apresentar as razões para aquilo que realmente deveria ser feito, do que tentar parecer moderado e razoável aceitando essencialmente os argumentos do oponente. Tentar o compromisso, sim, se for necessário, sobre as políticas a adotar - mas nunca comprometer a verdade.

Paul Krugman, Acabem com esta crise, tr. Alberto Gomes, Presença, 2012, p. 233, 234.

26 novembro 2012

Os Sofistas

Os Sofistas foram professores que na Grécia Antiga vendiam os seus serviços a quem quisesse aprender a «arte de usar bem a palavra». Nunca antes o domínio desta capacidade tinha sido tão importante. A necessidade de persuadir, de convencer as pessoas sem recorrer ao uso da força física exigia aos oradores o uso de uma outra força: a da palavra.
Para saberes mais sobre eles clica AQUI, AQUI e AQUI.

25 outubro 2012

A Matrix enquanto hipótese metafísica

«O filme Matrix apresenta-nos uma versão de uma velha fábula filosófica: um cérebro numa cuba. Um cérebro sem corpo flutua numa cuba que por sua vez está no laboratório de um cientista. O cientista encontrou maneira do cérebro ser estimulado com o mesmo tipo de inputs que um cérebro normal costuma receber quando está num corpo. Para se conseguir isto, o cérebro na cuba está ligado a uma gigante simulação do mundo. A simulação determina então quais são os inputs que o cérebro recebe. Por sua vez, quando o cérebro produz outputs estes são enviados para a simulação. O estado de funcionamento deste cérebro é igual ao de um cérebro normal, apesar de não estar num corpo. Da perspectiva deste cérebro as coisas são muito semelhantes àquilo que parecem a mim e a si.
Mas parece que este cérebro está completamente enganado. Parece que tem crenças falsas sobre tudo. Acredita que tem um corpo, quando afinal não tem. Acredita que está lá fora ao Sol, quando afinal está num laboratório escuro. Acredita que está num determinado sítio, quando, de facto, pode estar noutro completamente diferente. Talvez pense que está em Tucson, quando afinal está na Austrália ou mesmo no espaço sideral.
A situação do Neo no início do filme Matrix é similar a esta.»
David Chalmers

Texto a ler na íntegra no site Crítica

Outras ligações: 
Philosophy and the matrix
Vivendo na Matriz

10 outubro 2012

Vantagens da argumentação - Robert Nozick

Mesmo o leitor que não se deixe convencer pelos meus argumentos concordará que, ao esforçar-se por manter e defender a sua própria perspectiva, a clarificou e aprofundou. Além disso, agrada-me pensar que a honestidade intelectual exige, pelo menos ocasionalmente, que nos esforcemos por confrontar argumentos poderosos contrários às nossas opiniões. De que outra maneira podemos evitar a persistência no erro?
Robert Nozick, Anarquia, Estado e utopia, tr. Vítor Guerreiro, Ed. 70, p. 23.
[Ler mais]

07 setembro 2012

Kolak/Martin - Sabedoria sem respostas

A filosofia é uma actividade e não um corpo de conhecimentos. Como todas as actividades requer perícia. Que tipo de perícia? Em poucas palavras: a habilidade para nos vermos a nós próprios e ao mundo de muitas perspectivas diferentes. (…) No nosso dia-a-dia, desenvencilhamo-nos perfeitamente bem ao apoiarmo-nos apenas nas nossas perspectivas. Mas mesmo no dia-a-dia, especialmente em alturas de conflito, a capacidade de abandonar as nossas perspectivas em prol de outras pode ser extremamente útil. Em filosofia, esta habilidade não é apenas útil, é essencial. Sem ela não podemos resolver problemas que são insolúveis no interior das nossas perspectivas habituais.
No fundo, sabemos que as nossas perspectivas não são as únicas válidas. Mas tendemos a expulsar esse conhecimento para a periferia da nossa consciência. Isto deixa-nos com um sentimento ameaçador e inconfortável, quando somos confrontados com pontos de vista diferentes dos nossos. Quando admitimos que os nossos pontos de vista assentam, em última análise, em pressupostos questionáveis e baixamos os nossos escudos contra pontos de vista alheios, sentimo-nos inseguros. (…)
Ter um ponto de vista ajuda-nos a vermo-nos a nós mesmos e ao mundo. Mas, se nos tornarmos demasiado apegados às respostas derivadas e apoiadas pelos nossos próprios pontos de vista, ficamos cegos a outros pontos de vista. Logo, ter um ponto de vista pode esconder tanto como aquilo que revela.
A filosofia mostra-nos como identificar as limitações dos nossos próprios pontos de vista. Mas faz mais: ensina-nos a sair de nós próprios, a atravessar as fronteiras dos nossos familiares quadros de referência de respostas.
Kolak/Martin, Sabedoria sem respostas, tr. Célia Teixeira, Temas e debates, pp. 14-16.

filosofiareal

«Quem hoje em dia ensina filosofia não selecciona o alimento para o seu aluno com o objectivo de lhe adular o gosto, mas sim para o modificar.»
Wittgenstein